Edição de Jorge Croce Rivera José Marinho (1904-1975) «Hoje que reconquistei por assim dizer o sentido do valor da primeira inocência, embora, perdida, me seja difícil reavê-la e que abjuro cientemente de todo o cálculo e de toda a astúcia, em nome de Deus ou do homem, ou em nome do terrível amor-próprio e da cautela do bom nome e da glória terrestre, decidi-me finalmente a escrever espontâneo, a deixar-me falar ciente de mil vezes errar. Se alguma verdade há no homem, ela não é do homem, ou nem só dele. [?] Uma dificuldade aparece aqui. Ela é a de que não escrevo, como outros, da nossa melhor tradição filosófica latina ou germânica, ao canto do fogão, tranquilo e sábio. Para mim todo o saber humano é incessantemente reposto em questão, e reposta é incessantemente em questão toda a verdade divina. Pois estou com os cristãos e todos os melhores religiosos de todas as religiões e de todas as formas aparentes de descrença, quando sinto e fundamente e esclarecidamente penso que toda a via humana está desde o princípio errada e lastrada de pecado; por outro lado, ou de outro ponto do meu ser ou do meu pensamento (mais superficial? Mais fundo?), vem uma ideia diferente, ideia segundo a qual não há no homem erro, nem mal, nem pecado, senão na medida em que ele vive ainda prisioneiro da ilusão.? (Do «Prólogo», redigido nos anos cinquenta) Jorge Croce Rivera, licenciado em Filosofia pela Universidade Católica, apresentou tese de mestrado na Faculdade de Letras de Lisboa, A meditação do tempo no pensamento de José Marinho, e é docente na Universidade dos Açores.