Num dos discos de capa de serapilheira que Michel Giacometti publicou na década de 1960 uma voz destacava-se - a de Catarina Chitas, de Penha Garcia. A voz, mas também as cantigas, surpreenderam um Portugal urbano que desconhecia os passos que poucos - como Giacometti ou Ernesto Veiga de Oliveira - tinham dado à procura daquela maneira de cantar.O trabalho que Flávio Pinho aqui nos traz é de vital importância. Fixando vozes e contextos do seu soar, permite alargar o préstimo das criações da gente de Penha Garcia e dá alento à vontade, que é dos homens também, de saber coisas dos seus semelhantes e de poder gostar dos costumes que naqueles eram hábito. Saberá o leitor o que fazer com estes cantos - se ficar com eles para si ou se dar-lhes voz para que, de novo, sejam toada. Flávio Pinho cumpre aqui um papel que não estava previsto no tempo em que, em Penha Garcia, a transmissão das cantigas se fazia de boca a ouvido. Mas não deixa, por isso, de cumprir o papel de transmissor de sinais de que a cultura depende para perdurar. Durante muitos dias da sua vida, Flávio Pinho habitou as ruas, a gente, as vozes e o viver de Penha Garcia. É uma parte de tudo isso que partilha connosco nestas páginas.Manuel Rocha(do prefácio)